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sexta-feira, 29 de abril de 2011

Contos do Futebol - Pedagogia do Cone (João Batista Freire)




Encontrei Dona Clotilde outro dia desses e ela insistiu, mais uma vez: ela queria porque queria assistir a uma aula dessas de escolinhas de esportes. Eu desconversei, mudei de assunto, tentei fazê-la desistir da ideia, mas não teve jeito. Por mais que eu afirmasse que era uma coisa chata, que ela iria se aborrecer, a boa velhinha insistiu e insistiu, até que eu cedi e a levei a uma Escolinha de Futebol, bem próxima ao local onde estávamos. No caminho ela me explicou que tinha muita curiosidade a respeito das coisas da Educação Física e que, no caso do Futebol, a curiosidade aumentava. Afinal, fomos campeões do mundo quatro vezes. E o que acontecia agora que não conseguíamos ganhar de mais ninguém?
Achei melhor que ela mesma constatasse.
Entramos no campo onde se realizavam as aulas e sentamos numa arquibancada lateral ao gramado. O professor estava começando a aula e havia umas trinta crianças, meninos e meninas, com idades entre oito e dez anos mais ou menos.
Primeiro ele deu um aquecimento, colocou a criançada em roda e a cada exercício que ele mostrava, o alunos iam repetindo. Ele flexionava o tronco à frente e contava até oito. Aí a garotada flexionava o tronco e contava bem alto até oito. Depois fazia uma abertura lateral e nessa posição, contava até oito. Foram uns dez exercícios de alongamento. As crianças, muito flexíveis, não tinham qualquer problema com alongamentos, ao contrário do professor, que era bastante rígido. Aí a Dona Clotilde me fez a pergunta que eu temia: por que o professor e as crianças tinham que contar até oito durante cada exercício? Tive que confessar que não sabia. Não será porque ele está ensinando as crianças a contar? Insistiu ela. Continuei dizendo que não sabia explicar isso. Ou será que é até onde ele sabe contar? Agora a velhinha já mostrava um tom de gozação. Fiz de conta que não ouvi, e tentei mudar de assunto. Mas aí é que a coisa piorou, começou a aula propriamente dita. Atentamente a minha amiga acompanhava a organização da aula de futebol. O professor colocou os alunos em fila, atrás de uma série de cinco cones, separados um do outro por uma distância de um três metros. Na frente da fila de cones, a uns dez metros, uma trave e um goleiro. Ao sinal do professor, o primeiro aluno da fila partia com a bola nos pés, zigue-zagueava entre os cones, passava a bola ao professor após ultrapassar o último cone, recebia a bola de volta e a chutava ao gol. Em seguida voltava para a fila e aguardava sua vez. Como a aula tinha trinta alunos, durante os trinta minutos que durou aquele exercício, cada aluno deu seis chutes ao gol. Eu impaciente, aguardando a pergunta da Dona Clotilde, que veio logo: Por que ele usa aqueles cones? Sinceramente minha amiga, não sei. Acho que é para melhorar a agilidade das crianças. Ela não ficou satisfeita: Escuta, mas, durante o jogo tem algum cone no campo para as crianças contornarem? Achei que a boa velhinha estava me gozando e fiquei quieto.
Ela continuou: Você reparou que elas passaram quase todo o tempo da aula na fila? Será que ele está ensinando os alunos a ficarem em fila? No jogo de futebol tem que fazer  fila antes de chutar no gol? E quanto mais eu fazia cara de aborrecido, mais ela se divertia.
Antes de nos despedirmos, ela tentou me consolar. Olha, João Batista, eu sei que não é assim que você dá aula. E ambos sabemos que Pelé e Garrincha nunca teriam aprendido futebol se tivessem feitos essas coisas que o professor ensinou às crianças. Mas, pelo menos aprendi uma coisa: Agora sei porque é que a nossa seleção apanha tanto de todo mundo . Não é só culpa do Ricardo Teixeira.

Texto retirado da aula - tema: Aprendizado e Treinamento do Futebol e Futsal (pós graduação) 

Para se pensar........
"Se uma pessoa simples sem qualquer formação específica, no caso a Dona Clotilde, pode analisar e verificar todos esses equívocos com relação ao ensino e treinamento do futebol, como é que "nós" os profissionais do movimento corporal e do futebol, seja na iniciação ou no treinamento especializado, não percebemos o erro, e o que é pior, nos recusamos a mudar e continuamos errando, cooperando de forma direta para a formação com nível cada vez menor de nossos jogadores de futebol".

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Prof. Esp. Adelson Antonio de Souza 

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